Em fevereiro de 2018, a 1ª Seção do STJ julgou, sob o rito dos recursos repetitivos, o REsp 1.221.170 (“Caso Anhambi”), do qual foi relator o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, e pacificou o entendimento da corte no sentido de que seria aplicável a tese intermediária ao regime da não cumulatividade das contribuições do Pis e Cofins, não tão restritiva quanto a do IPI nem tão ampliativa quanto a do IRPJ. Estabeleceu-se que seriam considerados “insumos” os bens e serviços que fossem essenciais ou relevantes à atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. Nesta ocasião, o STJ declarou ilegais duas instruções normativas (INs 247/02 e 404/04),da Receita Federal, sob o argumento de que elas restringiam indevidamente o conceito de insumo.

  1.          No julgamento, o STJ mencionou que a definição restritiva de “insumo” contida nas Instruções Normativas 247/02 e 404/04, semelhante à adotada na legislação do IPI, é ilegal por desrespeitar o comando contido no artigo 3º, II, das leis 10.637/02 e 10.833/03. Afirmou que o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. Sedimentou, ainda, que essa “essencialidade” ou “relevância” se verifica a partir do “teste de subtração”, sendo necessário perquirir se a supressão do dispêndio obstaria a atividade empresarial, isto é, impossibilitaria a prestação do serviço ou da produção ou, ao menos, ocasionaria substancial perda de qualidade do produto ou serviço. Ainda mencionou que a avaliação do atendimento a esses critérios deve ocorrer de forma casuística, dependendo do objeto da empresa.
  2.      Tentando dirimir qualquer tipo de dúvida a respeito do novo conceito de insumos, a Receita Federal publicou o PARECER NORMATIVO COSIT/RFB Nº 05, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2018. 
  3.      Neste parecer a Fazenda traz hipóteses de aproveitamento de insumos, que aos olhos da Fazenda, surgiram com o novo entendimento e enumera outras hipóteses que já entendia cabíveis. São as seguintes:
  4. 1)insumo do insumo ( no caso de empresas que produzam seus próprios insumos)
  5. 2)subcontratação na prestação de serviços
  6. 3)custos com a fase de pesquisa e desenvolvimento se estes gerarem o produto ou o serviço ( esforço bem sucedido)
  7. 4) custos e despesas com água, materiais de exames laboratoriais, materiais de limpeza, e EPI ( equipamento de proteção individual)
  8. 5) fretes durante o desenvolvimento da atividade
  9. 6 )testes de qualidade de produtos exigidos pela legislação 
  10. 7)tratamento de efluentes do processo produtivo exigido pela legislação
  11. 8) bens utilizados para manter bens de produção funcionando, como serviços de manutenção ou combustível para as máquinas
  12. 9)bens que apresentarem valor unitário não superior a R$ 1.200,00 ou prazo de vida útil não superior a 1 ano. (Ex. moldes ou modelos, ferramentas e utensílios, itens consumidos em ferramentas, como brocas, bicos, pontas, rebolos, pastilhas, discos de corte e de desbaste, materiais para soldatura, oxigênio, acetileno, dióxido de carbono, etc)
  13. 10)inspeções regulares
  14. 11)produtos e serviços de limpeza, desinfecção e dedetização de ativos produtivos, quando aplicados no ambiente produtivo da empresa
  15. 12) pesquisas e desenvolvimento como atividades destinadas à obtenção de novo conhecimento, busca, avaliação e seleção final das aplicações dos resultados de pesquisa ou outros conhecimentos, busca de alternativas para materiais, dispositivos, produtos, processos, sistemas ou serviços, formulação, projeto, avaliação e seleção final de alternativas possíveis para materiais, dispositivos, produtos, processos, sistemas ou serviços novos ou aperfeiçoados.
  16. 13)pesquisa de recursos minerais e energéticos.
  17. 14) terceirização de mão de obra a pessoa jurídica na produção de bens ou prestação de serviço
  18. 15)testes de qualidade 
  19.      Apesar de trazer hipóteses como insumo do insumo, subcontratação na prestação de serviços (serviços terceirizados), testes de qualidade, e bens e serviços utilizados no processo produtivo por imposição legal, que no seu entendimento foram decorrentes do novo julgado do STJ, a Fazenda restringiu neste parecer o conceito estabelecido no julgado, pois há outras hipóteses trazidas no parecer que promovem estreitamento dos limites e parâmetros estabelecidos pelo precedente do STJ.
  20.          Exemplo disso foi a conclusão de que somente estariam inseridos no conceito de insumos aqueles bens ou serviços que fossem inseridos em processo do qual efetivamente resultasse bem destinado à venda ou à prestação de serviços a terceiros (esforço bem-sucedido).
  21.      Seguindo este entendimento, a Fazenda afirma que atividades que não gerem tais resultados, “como pesquisas, projetos abandonados, projetos infrutíferos, etc.” não ensejam direito a crédito.
  22.      O fundamento seria a norma contida no artigo 3º, parágrafo 13º, da Lei 10.833/03, segundo a qual “deverá ser estornado o crédito (…) relativo a bens (…) utilizados como insumos na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, que tenham sido furtados ou roubados, inutilizados ou deteriorados, destruídos em sinistro ou, ainda, empregados em outros produtos que tenham tido a mesma destinação”.
  23.    Ora, é evidente que a norma acima não trata da mesma hipótese. Além disso, no precedente do STJ, não há qualquer menção que permita a interpretação de que o creditamento somente seja admitido em relação a insumos utilizados em operações que sejam bem sucedidas. Tanto que, no próprio parecer normativo, há menção de que este é “um ponto não abordado pelos ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça”, mas que supostamente decorreria da legislação do PIS e da Cofins.
  24.     Em várias atividades econômicas, a frustração de expectativas é inerente às atividades que constituem o objeto empresarial, como o de óleo, gás e mineração. E o parecer desconsidera essas hipóteses quando dispõe que “não são considerados insumos para fins de apuração de créditos das contribuições os dispêndios da pessoa jurídica com pesquisa e prospecção de minas, jazidas, poços, etc., de recursos minerais ou energéticos que não chegam efetivamente a produzir bens destinados à venda ou insumos para produção de tais bens”.
  25.     Outra interpretação que restringe o âmbito de aplicação das premissas estabelecidas pelo precedente do STJ é a que nega a possibilidade de creditamento em relação à gastos posteriores à finalização do processo de produção ou à prestação de serviços.
  26.      Conforme o parecer normativo, não seriam passíveis de creditamento os gastos com transporte (frete) de produtos acabados de produção própria para centros de distribuição ou para entrega direta ao adquirente, tais como: combustíveis utilizados em frota própria de veículos; embalagens para transporte de mercadorias acabadas; e contratação de transportadoras.
  27.      O parecer afirma que a expressão genérica “para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte”, disposto na ementa do acórdão do REsp 1.221.170, deve ser aplicada apenas ao processo produtivo e à prestação de serviços, não alcançando, portanto, as etapas de comercialização das mercadorias produzidas, porque estas mercadorias já estariam acabadas. Ocorre que o STJ não restringiu a tese do repetitivo nesse sentido, em momento algum. Quando se menciona “atividade econômica” é evidente que esta abrange a fase final, de venda aos clientes finais, até porque é esta a parcela da atividade que vai gerar lucro para a empresa, e assim manter a atividade econômica em funcionamento. 
  28.     Vejamos o seguinte trecho do parecer : “conquanto essa expressão, por sua generalidade, possa fazer parecer que haveria insumos geradores de crédito da não cumulatividade das contribuições em qualquer atividade desenvolvida pela pessoa jurídica (administrativa, jurídica, contábil, etc.) a verdade é que todas as discussões e conclusões buriladas pelos Ministros circunscreveram-se ao processo de produção de bens ou de prestação de serviços desenvolvidos pela pessoa jurídica”.
  29.        A decisão do STJ deixou claro que podem ser considerados insumos tudo o que for “essencial ou relevante para o exercício da sua atividade econômica”. 
  30.       Desta forma, é forçoso se chegar a conclusão de que ser essencial ou relevante para a atividade econômica independente do momento em que os insumos forem utilizados nas atividades realizadas pela empresa, mesmo que posterior à produção ou prestação de serviços. 
  31.      Por exemplo, é evidente que o frete das mercadorias acabadas é essencial ao escoamento da produção por parte do estabelecimento que as industrializou. Assim, esse frete deve ser considerado insumo que gera direito ao creditamento nas contribuições do PIS e COFINS.
  32.        Devido ao exposto, chegamos à conclusão de que este Parecer Normativo COSIT/RFB 05/2018 demonstra que será necessário um tratamento cada vez mais específico, por parte dos contribuintes, dada a possibilidade de haver interpretações que ficam à mercê da Fazenda.

 

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